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No início do século XXI, nomeadamente em ciências como a astronomia e a genómica, foi cunhada a expressão “Big Data” que, no contexto da uma sociedade de informação em expansão, se foi progressivamente estendendo a todas as áreas do comportamento humano (Mayer-Schönberger e Cukier, 2013).
O aparelhamento tecnológico da comunicação humana e a proliferação de tecnologias de processamento massivo de informação de toda a espécie — informação ela própria em crescimento exponencial pelo seu registo computacional e pelas bases que acumulam dados registados sob a forma de memória digital — teve duas consequências principais.
A primeira foi a de colocar à disposição uma quantidade de informação inaudita que se multiplica em permanência.
A segunda foi a possibilidade de, a partir dessa grande quantidade de dados, desse Big Data, se poder produzir conhecimento útil, preditivo e rentável. Isso não significa que a utilidade, a previsibilidade e a rentabilidade não estivessem ligadas, desde a modernidade, à conquista do conhecimento, concebido como uma forma de dominação e de poder sobre a realidade. Significa, antes, que com o Big Data chegou um modelo epistemológico que segue um caminho diferente da tentativa tradicional de estabelecer relações de causalidade focadas na explicação do “porquê” dos fenómenos. No modelo epistemológico do Big Data trata-se sobretudo de “saber que” (saber o que acontece e saber o que irá acontecer) e não tanto perceber porquê. Assim, "saber que” é, na perspetiva do tratamento do Big Data, suficiente. Para quê procurarmos perceber por que é que os humanos agem desta ou daquela maneira, se pudemos ter acesso a probabilidades de grande acuidade sobre o padrão dessa ação?
A produção de dados, seja ela realizada por operações que ficam desde logo registadas em suportes digitais ou que são capturadas por intermédio de sensores ou de outros aparelhos que comunicam a sua coleta a bases de dados (veja-se, por exemplo, a internet das coisas), criou uma acumulação caótica de dados que foi olhada como tendo potencialmente um valor preditivo, de antecipação fenoménica e comportamental, caso a conseguíssemos ordenar, ou seja, criar a partir dela correlações e padrões. A palavra francesa para computador, “ordinateur”, espelha bem a função dos computadores enquanto instância de processamento automatizado de ordenação de dados. Mas é bom não esquecer que essa função só pode ser efetuada através de uma conversão digital da informação (linguagem binária de 1 e 0), implicando um sistema de codificação e de descodificação numérica. Implica também a materialidade do computador (hardware) e de nessa materialidade correr um sistema operativo (software) capaz de receber e processar a informação codificada.
A aproximação informática ao Big Data nutre e intensifica uma convicção epistemológica antiga: a de que os dados falam por si e que é preciso deixá-los falar por eles mesmos. Se assim fizermos, através dos padrões e das correlações que entre eles podem se podem estabelecer, poderemos monitorar em “tempo real” e intervir antecipadamente nos fenómenos e nos comportamentos, seja para nos precaver, seja para os controlar.
O Big Data — por alguns considerado como o novo petróleo, quando encarado do ponto de vista da sua rentabilização —, implica uma base tecnológica com grande capacidade computacional para processar grandes mananciais de dados; implica critérios analíticos geralmente relacionados com objetivos de produzir conhecimentos nas mais variadas áreas e para os problemas que se querem resolver, mas que não estão ao alcance do cálculo humano; está ligada à convicção profunda — e algo mitológica — segundo a qual trabalhar com o Big Data permite produzir conhecimentos e ter acesso a visões antes impossíveis de alcançar. Os seus produtos estão envolvidos numa aura de verdade, objetividade e precisão, adquirindo uma dimensão oracular (Cf. Santaella, 2021). A esta filosofia dá-se o nome de dataísmo.
Com este, surge, nas palavras de E. Sadin (2015, p. 29) “uma era de medição e quantificação de qualquer unidade orgânica ou física, passando-se do mero quadro do conhecimento factual das coisas para uma avaliação qualitativa e em constante evolução das pessoas e situações".
Já segundo Mejias e Couldry (2019, p. 3), a recolha e codificação de dados — a que se chama datificação — "combina dois processos: o da transformação da vida humana em dados através de processos de quantificação e a geração de diferentes tipos de valor a partir dos dados. Apesar de ser estranho, o termo dataficação é necessário porque sinaliza um método historicamente novo de quantificar elementos da vida que até agora não eram quantificados nesta medida”.
Os dados, de um ponto de vista digital, são o resultado de uma codificação. E a codificação não é uma transposição neutra da realidade para uma linguagem que a replicaria, mas um modo de interpretar a realidade. Todos os sistemas de análise são intérpretes de dados e os dados só aparecem como tal num determinado quadro de inteligibilidade e sob padrões que definem o seu “racional”. “Dado”, de um ponto de vista digital, resulta então de um processo de datificação, o que quer dizer que os dados são capturados (não são data, são capta, como insistiu Johanna Drucker, 2001, §3), de modo a poderem ser recursos utilizáveis e rentabilizados no quadro de um pensamento lógico-matemático automatizado.
Finalmente, e como sublinhou Johanna W. Smit (2021, p. 131), “além das vantagens representadas pelo início da computação nas CHS [Ciências Humanas e Sociais], a progressão para a fase atual representa um desafio – imenso para muitos – da passagem de um modo de produção e escrita do conhecimento caracterizado pela retórica, para um modo de produção subordinado à lógica”.
Referências bibliográficas
Drucker, J. (2011). Humanities Approaches to Graphical Display. Digital Humanities Quarterly, 5 (1)1. http://www.digitalhumanities.org/dhq/vol/5/1/000091/000091.html
Mejias, U. A. & Couldry, N. (2019). Datafication. Internet Policy Review, 8(4) DOI: 10.14763/2019.4.1428.
Mayer-Schönberger, V; Cukier, K. (2013). Big Data: A Revolution That Will Transform How We Live, Work, and Think. Houghton Mifflin.
Sadin, E. (2015). La vie algorithmique. Critique de la raison numérique. Éditions de L’Échappée.
Santaella, L. (2021). O metabolismo digital das humanidades. In Cleomar Rocha, Hugo A. D. do Nascimento e Fabrizzio Alphonsus Alves de Melo Nunes Soares (Org.). Humanidades digitais: performatividades na cultura digital. UFG. https://producao.ciar.ufg.br/ebooks/invencoes/livros/9/capa.html
Smit, J. et al (2021). Humanidades digitais, big data e pesquisa científica. Fundação Henrique Cardoso.
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Esta expressão é utilizada para designar um conjunto de de técnicas variadas que procuram articulações, padrões (por exemplo se-> então), estruturas subjacentes, variáveis importantes ou insights a partir de um conjunto alargado de dados digitais (Big Data).
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Ver artigo de Mejias, U. A. & Couldry, N. (2019). Datafication. Internet Policy Review, 8(4). https://doi.org/10.14763/2019.4.1428
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Acrónimos para designar grupos de grandes empresas tecnológicas. O primeiro, GAFAM, inclui: Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft. O segundo, BAT, inclui: Baidu, Alibaba e Tencent.
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Acrónimo do inglês “Large Language Model” (Modelos de linguagem de grande escala). Assentam a sua base de funcionamento numa rede neuronal, altamento complexa e parametrizada e são treinadas através de técnicas de aprendizagem de máquina não supervisionada, alimentando-se de grandes quantidades de dados.
Os estudos sobre o digital englobam abordagens monodisciplinares, multidisciplinares, interdisciplinares e transdiciplianres. Por isso importa definir sucintamente cada um destes termos:
• Monodisciplinar: investigação muito focada num objeto de estudo ou na solução específica e bem delimitada de um problema. Poderíamos dizer que a perspectiva monodisciplinar se efetua em circunscrições bem definidas e com alto grau de especialização que procuram desenvolver a própria disciplina.
• Multidisciplinar: investigação que procura convocar e agregar conhecimentos provenientes de diferentes áreas disciplinares, pondo em evidência a diversidade de perspetivas especializadas monodisciplinares que o conhecimento dos fenómenos pode ter. Trata-se de mostrar a variedade de abordagens especializadas que, sobre um mesmo fenómeno, podem existir.
• Interdisciplinaridade: investigação que pretende produzir inteligibilidade compreensivas e explicativas complexas e multifactoriais e onde se procuram fazer dialogar e trazer para um plano colaborativo as diferentes abordagens disciplinares, formando uma perspetiva alargada que geralmente engloba a relação entre conhecimento e vida social no equacionar articulado da relação entre teorias e práticas.
Transdisciplinar: investigação que convoca saberes especializados e disciplinares, bem como abordagens interdisciplinares para proceder à organização de um tema. Na realidade, o ponto de vista transdisciplinar é uma forma de tematizar assuntos sem cair numa dimensão técnica e instrumental (tecno-solucionismo) e sem ter a veleidade de fechar a questão. As abordagens transdisciplinares tendem a equacionar problemas e a lidar com eles sem alcançar soluções definitivas. Ou seja, lidar com o problema e não solucionar ou resolver (no sentido de erradicar) o problema.
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Num breve texto intitulado “Uma dificuldade no caminho da psicanálise”, escrito em 1917, Sigmund Freud refere três ofensas narcísicas à humanidade. Utilizou esta expressão para assinalar três importantes momentos em que a ciência descentrou o ser humano, retirando-o de uma posição privilegiada, ou seja, afetando a sua autoimagem de grandiosidade e de omnipotência.
Eis a passagem do texto de Freud:
«(...) o amor próprio da humanidade sofreu até agora três graves ofensas por parte da investigação científica:
a) O homem acreditava, no início, na época inicial da sua investigação, que a Terra, sua sede, se encontrava no centro do Universo, enquanto o Sol, a Lua e os planetas giravam em torno dela. (...) A destruição desta ilusão narcisista relaciona-se para nós com os trabalhos de
Nicolau Copérnico, no século XVI. Muito antes dele, já os pitagóricos tinham posto em dúvida a situação preferencial da Terra, e Aristarco de Samos afirmara, no século III a.C. que a Terra era muito mais pequena que o Sol e que se movia em torno deste. Assim, pois, também a grande descoberta de Copérnico tinha sido feita antes dele. Mas quando foi já geralmente reconhecida, o amor próprio humano sofreu a sua primeira ofensa: a ofensa cosmológica.
b) No decurso da sua evolução cultural o homem considerou-se como o soberano de todos os seres que povoavam a Terra. E não se contentando com isso, criou um abismo entre entre si e eles. Negou-lhes a razão e atribuiu-se uma alma imortal e uma origem divina, que lhe permitiu romper o laço e comunidade com o mundo animal (...) Todos sabemos que as investigações de Darwin e as dos seus precursores e colaboradores puseram fim, à pouco mais de meio século, a esta exaltação do homem. O homem em nada é distinto do animal, nem melhor do que ele; procede da escala zoológica e está proximamente aparentado a umas espécies e mais longinquamente de outras. (...) Esta é a segunda ofensa: a ofensa biológica — infringida ao narcisismo humano.
c) Mas a ofensa mais sensível é a terceira, de natureza psicológica. O homem, apesar de exteriormente humilhado, sente-se soberano da sua própria alma. (...) Confias em que tudo o que sucede na tua alma chega ao teu conhecimento, já que a consciência se encarrega de te anunciá-lo. Chegas inclusivamente a identificar o anímico com o consciente; isto é, com o que te é conhecido, apesar da evidência de que na tua vida psíquica tem que suceder muito mais do que chega a ser conhecido pela tua consciência. Deixa-me instruir-te sobre este ponto. O anímico em ti (no Eu) não coincide com o que te é consciente; uma coisa é que algo suceda na tua alma, outra é que tu chegues a ter conhecimento disso. (...) Assim quis a psicanálise ensinar o Eu. Pois as suas duas teses, a de que vida instintiva da sexualidade não pode ser totalmente dominada em nós e a de que os processos anímicos são em si inconscientes, e apenas mediante uma percepção incompleta e pouco fidedigna chegam a ser acessíveis ao Eu e submetidos a ele, equivalem à afirmação de que o Eu não é dono e senhor em sua própria casa. E representa a terceira injúria infringida ao nosso amor próprio: uma injúria psicológica.» (OC, vol II, 1018-1020).
Nos dias de hoje tem-se colocado a questão de saber se a IA não representa uma quarta ofensa narcísica à humanidade, a ofensa algorítmica, uma vez que faz os humanos conviver com agentes racionais não humanos.
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O Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados define requisitos pormenorizados em matéria de recolha, armazenamento e gestão de dados pessoais, aplicáveis tanto a empresas e organizações europeias que tratam dados pessoais na UE como a empresas e organizações estabelecidas fora do território da UE que tratam dados pessoais de pessoas de vivem na UE.
Para informação mais detalhada consultar
https://europa.eu/youreurope/business/dealing-with-customers/data-protection/data-protection-gdpr/index_pt.htm
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Última atualização em 9 de abril de 2025